junho 23, 2025

Real valorizado e Bolsa em alta: euforia nos mercados testa fôlego do governo Lula.

Dólar atinge mínima do ano, Ibovespa bate recorde e analistas discutem impacto de medidas econômicas e relação com a China.

O mercado financeiro brasileiro viveu, nesta semana, uma combinação rara: dólar em queda livre, Bolsa em alta histórica e fluxo recorde de capital estrangeiro. O real se valorizou mais de 6% em 30 dias e o Ibovespa superou os 135 mil pontos, maior patamar nominal da história.

A valorização da moeda brasileira levou o dólar a fechar abaixo de R$ 4,90, o menor nível desde julho de 2023. Já o índice da B3 subiu mais de 15% no acumulado de 2025, impulsionado por empresas exportadoras e pelos setores financeiro e de commodities.

Analistas apontam uma série de fatores para explicar o otimismo. A expectativa de queda de juros nos Estados Unidos aumentou o apetite global por ativos de países emergentes. Além disso, o Brasil tem sido beneficiado por uma balança comercial robusta e pela melhora no humor externo.

A visita do presidente Luiz Inácio Lula da Silva à China, em abril, também ajudou a reforçar o cenário positivo. O anúncio de acordos bilionários em infraestrutura, energia e tecnologia, além de sinalizações diplomáticas equilibradas, agradaram investidores.

Segundo o economista-chefe da Warren Investimentos, Felipe Salto, a percepção de que o Brasil é um “porto seguro” entre os emergentes ganhou força. “O real está barato, a Bolsa tem empresas lucrativas e o risco fiscal, embora alto, está sendo tolerado pelo mercado”, disse.

Apesar do bom momento, Salto alerta para riscos. A indefinição sobre a meta fiscal de 2025, o embate entre Executivo e Congresso e a possibilidade de desaceleração da economia chinesa ainda rondam o cenário. “É preciso cautela. Há mais emoção que fundamento no curto prazo”, afirma.

Do lado do governo, o Palácio do Planalto comemora a reação dos mercados como uma chancela à política econômica conduzida pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad. A aprovação da reforma tributária e a manutenção do arcabouço fiscal são frequentemente citadas como trunfos.

Mas nem todos compartilham da mesma visão. Para o ex-diretor do Banco Central Alexandre Schwartsman, o governo acerta ao manter o discurso fiscalista, mas erra ao pressionar o BC por juros mais baixos. “O dólar só caiu porque os EUA deram sinal de corte. Não foi mérito do Planalto”, disse.

O desempenho da Bolsa também foi turbinado pela alta do minério de ferro, petróleo e soja. Empresas como Vale, Petrobras e bancos lideraram os ganhos. O volume negociado na B3 cresceu 18% em relação à média dos três meses anteriores.

Investidores estrangeiros voltaram a comprar ações brasileiras com força. Só em abril, o saldo positivo ultrapassou R$ 12 bilhões. É o maior fluxo desde o início do governo Lula 3, em janeiro de 2023.

A política externa do Brasil, com foco no sul global e reaproximação com a Ásia, tem sido vista com bons olhos por grandes fundos. A assinatura de protocolos com a China para pagamentos em moeda local também sinaliza uma tentativa de reduzir a dependência do dólar.

Para o analista Pedro Serra, da Ativa Investimentos, o momento é de oportunidade, mas não de euforia cega. “O investidor precisa olhar além da manchete. O Brasil ainda tem desafios fiscais e institucionais que podem mudar tudo de uma hora para outra”, afirmou.

Ainda assim, há otimismo entre gestores de fundos e bancos de investimento. A avaliação geral é que, mesmo com ruídos políticos, a economia brasileira conseguiu manter estabilidade e gerar oportunidades.

No cenário doméstico, a inflação segue sob controle e a taxa Selic deve seguir em queda até o segundo semestre. O mercado já precifica juros abaixo de 10% em 2026, o que favorece setores como varejo, construção civil e tecnologia.

Com os ganhos recentes, o Ibovespa passou a ser negociado com desconto em relação aos pares emergentes, mesmo com o recorde. Isso aumenta a atratividade para investidores internacionais em busca de retorno com menor risco.

O desafio, agora, é manter o fôlego. Com eleições municipais no horizonte e novas pautas fiscais no Congresso, o ambiente pode mudar rapidamente. A resposta do governo a esses testes pode definir se o ciclo de alta se sustentará — ou não.